A velhice me sorri logo ali
Hoje, 21 de agosto, meu primeiro neto faz 17 anos. Depois de amanhã, minha única neta biológica faz 14 anos. Não me sinto assim, mas os indícios são de que a velhice chegou, está me sorrindo ali da frente. E eu ainda tenho coisas pra fazer. Acho que tenho, pelo menos…
Meus netos não moram por perto… nem nasceram perto, e eu, infelizmente, não os vi crescer. Minha separação da avó, primeiro, a mudança dela e das filhas pro Rio e Florianópolis, depois, e a mudança definitiva pros Estados Unidos, mais depois, junto com meu segundo casamento ainda no primeiro tempo da jornada delas, nos afastaram.
Os encontros, quando viajava até elas ou quando vinham passar férias em Brasília, primeiro, e no Brasil, depois, não eram suficientes para compensar o tempo distante. Telefones, pra mim, não encurtam distâncias, e quando as redes sociais, o Skype primeiro e o Whats’App depois, se consolidaram, cada uma já tinha construído sua família e seu mundo, onde eu fiquei sendo o avô distante.
Na única vez que fui aos Estados Unidos, Luka não tinha nascido ainda. Já Sophia eu conheci no dia em que a mãe soube que ia ter uma menina: ela viera a Brasília e eu a levei a uma clínica para exames e um ultrassom. As imagens estão gravadas no meu computador…
Nos últimos dias de vida de minha mãe, com ela agitada pela imobilidade e sem conseguir dormir, eu ficava escutando suas histórias e suas auto recriminações. Uma delas era a distância que sempre manteve das netas, fosse pelo jeito de ser dela, fosse pelas contingências da vida. No fundo, eu estava sendo recriminado também e me prometi, então, em tentar diminuir esta distância. No fim do ano, comprei passagens e combinei com minhas filhas de passar uns dias com elas no início do ano seguinte.
Em março do ano seguinte, este ano, o coronavírus ainda era um risco distante, e eu voei pros Estados Unidos, guiado pela filha caçula. Tive que voltar em uma semana… o covid19 explodira. As cidades se fechando, os voos sob ameaça de cancelamento… e eu era do grupo de risco… para mim e para os outros.
Prometi a mim mesmo que voltaria, e a época ideal para alguém não aceitando, mas reconhecendo a velhice, é agora, antes do inverno. Não vai dar, a pandemia permanece e a proibição de voos perdura. Vou ficar torcendo, então, pra que minha liberdade de locomoção, já restrita por causa da visão cada vez mais opaca e reduzida, não se torne um obstáculo intransponível. E eu seja obrigado a aceitar que lugar de velho é hospital ou cemitério.