A queda de um mito – 1º capítulo
(Resumo das temporadas anteriores): uma região distante é governada por um poderoso Mito, amado por muitos, odiado por outros tantos mas, principalmente, temido por todos, seja por apregoar contar com o apoio dos carabineiros, as Forças Armadas da região, seja por ser o líder (oficioso) dos mosquetianos, os paramilitares da região, seja por delegar poderes apenas para 03 de seus filhos, todos da mesma laia violenta e inescrupulosa. Participando de uma quermesse em sua aldeia, o Mito, para fazer uma desfeita ao conselho superior dos governantes, que ele preside, anunciou a nomeação dele e dos filhos como Os 04 Cavaleiros da porca Alice, uma porca de 15 arrobas, arrematada, fraudulentamente, por ele, no bingo da quermesse. Seus adversários políticos resolveram investigar o assunto e eu, um farejador do CAD/SS, fui para a aldeia do Mito, onde levantei todos os seus podres, mas não de modo suficiente para derrubá-lo do poder. Diretamente subordinado a Judgemorus, o chefe da segurança do Conselho e seu potencial rival num futuro próximo, fui mantido na missão, agora com o objetivo de encontrar Keyróssis, o sumido braço direito do Mito. E encontrei.)
Na verdade, eu encontrei o cocheiro, carregador de mala, companheiro de pescaria e ligação financeira de Zirousiro com os mosquetianos por mero acaso. Eu estava indo pra Anhangabaúba pra me encontrar com o Ziroutrhee, pretendendo me entrosar com o grupo do clã na mais rica e progressiva aldeia da região que, por coincidência tinha como presidente do Conselho Gestor o maior concorrente político de Zirouziro, Jodorius, um brilhante self-made-man, que ficara rico com uma casa de pasto, uma taberna sofisticada, que promovia encontros dos homens de dinheiro de toda a região com políticos e candidatos a políticos.
Anahngabaúba fervilhava com as novas oportunidades surgidas com as primeiras fábricas dos donos do poder na região: os tradicionais fazendeiros, donos de gado e culturas, começavam a ser substituídos por grandes artesãos e comerciantes que, a partir das aldeias, cada vez mais habitadas, se expandiam e criavam oportunidades de empregos, desconcentrando a riqueza enclausurada nas fazendas e distribuindo-a por mais gente.
A caminho de lá, isto ficou evidente para mim: todas as aldeias que visitara até então, eram semelhantes. A aldeia num ponto central, inteiramente cercada de fazendas por todos os lados, algumas com estábulos dentro da própria aldeia. Anhangabaúba não! As fazendas ficavam mais distantes da aldeia e aquelas que, anteriormente ficavam próximas, tinham sido transformadas pelos novos ricos, em fábricas ou grandes depósitos e em sítios e chácaras de lazer de fim de semana ou pequenos condomínios rurais – 06 a 08 casas em meio a quintais arborizados em torno de uma pracinha.
Fiquei curioso para conhecer aquele modernismo pra mim, que nem chegara à capital ainda, um sítio, e entrei numa estradinha de pedregulhos que adentrava um condomínio. Numa casa, uma placa anunciava o dono da casa: Wassefus, doutor em leis, defensor dos aldeãos junto aos poderes constituídos. Bati palmas no portão, demorou pra aparecer alguém. Continuei batendo até que a porta da frente se abriu e um sujeito careca e de pijama apareceu, meio estremunhado. Pedi desculpas, mas queria falar com o doutor das leis. Ele me mandou aproximar, explicou que era amigo dele e que ele não viria aqueles dias, pois estava cuidando de um problema muito sério na capital. Ele ia fazer um café, se eu quisesse entrar, seria um prazer conversar um pouco e, depois, ele me daria o endereço do Wassefus em Anahngabaúba.
Pois não é que o amigo do Wassefus era o Keyróssis? E, percebi logo, estava muito solitário, sentindo falta de uma conversa. Aceitei o café, mas não tentei alongar muito a conversa – o mais importante era chegar a Anhangabaúba e avisar o CAD/SS onde estava Keyróssis, que eles arrumariam um jeito, a partir da documentação que eu havia coletado e mandado pra capital, de pegá-lo e mantê-lo preso e longe das vistas de Zirouziro.
– Está com problemas com a Comissão daqui?
– Na verdade não… Eu sou ledor de estrelas e estou tendo problemas com um aldeão de Ibirapitanga, que não gostou da mulher ter ido se consultar comigo. Passou a me acusar de charlatão, tentando arrumar uma briga pública. E eu, como fiel discípulo de Ó’deCavalo, abomino a violência… violência só com palavras! Preciso de um jeito legal de calá-lo e de mantê-lo afastado de mim…
– Tem um jeito melhor de conseguir isto sem interferência de um doutor de leis e sem pagar os olhos da cara por isto… Eu tenho amigos por toda a região que costumam resolver estes assuntos apenas com conversa ao pé do ouvido…
– Você tem amigos mosquetianos?
– Eu sou mosquetiano…
– Se me permite a ousadia, o que um mosquetiano faz num lugar solitário como este aqui?
– Eu posso causar problemas para um grande amigo meu, e ele pediu pra eu me afastar uns tempos. Mas, confesso que estou ficando de saco cheio. Aliás, você que fala com as estrelas e está vindo de Ibirapitanga, sabe me dizer como ficou a história dos 04 Cavaleiros da porca Alice?
– Não ficou ainda… Até onde sei, Zirouziro está na capital tentando controlar o Conselho dos Bem Nascidos, mas está tendo dificuldades… até gente dele não gostou da afronta de se nomear e aos filhos como Cavaleiros… e de uma porca ainda por cima!
– Ele vai conseguir! Ele cresce muito quando parte pro confronto!
– Você o conhece bem?
– Desde quando éramos carabineiros… muito tempo! (continua amanhã)