Há uma contraposição lógica: em 28 anos, de 1991, quando o Distrito Federal passou a eleger seus governadores, até agora, apenas dois políticos de esquerda se elegeram à governança distrital, e eles não foram marcantes. Cristóvão Buarque, um intelectual que foi reitor da UnB, fracassou como gestor de uma cidade (sua única marca foram as faixas de pedestre), e Agnelo Queiróz, médico originário do PCdoB, conseguiu ser pior gestor que José Roberto Arruda, um governador que foi preso por corrupção deslavada (mas está solto, por não representar perigo ao poder constituído, como Lula, e, provavelmente, guardar muitos segredos ‘delatáveis’ do PSDB, do qual foi líder no Senado).
Assim, se você junta as classes alta e média estatais, historicamente beneficiadas pelo sindicalismo petista, mas que têm horror a perder os privilégios conquistados, especialmente a partir dos governos lulistas, com a classe pobre, que foi beneficiada com um dos anseios básicos do ser humano, um lote/teto inteiramente grátis e seu para morar, a opção eleitoral torna-se óbvia…
Acrescente-se o fator Globo, que desanca Lula desde 1989, mas não conseguiu derrubá-lo. Já com Dilma… Explico: Lula, um político formado no sindicalismo, nunca foi esquerdista, e sabia a importância de empregados e empresas conviverem e enriquecerem juntos, tanto que a elite e o povão ganharam em seu governo (um cara que sai da Presidência com quase 90% de aprovação, precisa ser morto ou preso, acha a direita!); Dilma, uma tecnocrata formada na esquerda radical, não!
Como eu já escrevi aqui mesmo, tempos atrás, a esquerda tem um defeito de fabricação: ela acredita em pesquisas e estatísticas que comprovam que o povão sofre, enquanto a elite se esbalda. Pesquisas e estatísticas estão corretas, mas só mostrar isto não muda a situação. Todo o sistema político-jurídico-econômico-educacional brasileiro foi construído, ao longo de 500 anos, pela elite, o que resultou ontem e resulta hoje em sacanagens explícitas.
Por que Getúlio se suicidou? Por que Jango foi deposto? por que Lula, homem do povo, está preso, e Aécio, homem da elite, não? Como um juiz em férias, herói da mídia, derruba a decisão de um desembargador, ilustre desconhecido, de plantão, e a suprema corte não tuge nem muge? Como um juiz superior de plantão, Luís Fux, concorda com um juiz de férias? As leis, feitas pela elite, dão margem a isto mas, muito mais do que as leis, a população permite isto…
O Distrito Federal é a prova inconteste disto: tem o maior rendimento domiciliar per capita do país e, ao mesmo tempo, uma desigualdade social que, no Brasil, só é inferior à do Amazonas. A primeira é de R$2.460,00 no Distrito Federal, contra R$1.373,00 na média brasileira e R$1.898,00 em São Paulo, Estado mais rico da Federação. A segunda, medida pelo Índice GINI, baseado em dados do PNUD/IBGE, é de 0,602, enquanto o Brasil está em 0,591 (quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade). E, mesmo assim, vota em peso na direita! E aplaude o presidente e seu ministro da Justiça quando, num populismo explícito e barato, vestem camisas do Flamengo e vão ao Estádio torcer por um time que não é deles!
Seria masoquismo? É plausível, vista recente reportagem da Folha de São Paulo: mostrando que o pagamento de certos penduricalhos que engordam os salários de algumas categorias funcionais do governo federal custou ao Tesouro quase R$1,7 bilhão em 2018. Isto significa que só de salário extra, determinadas categorias de servidores receberam uma remuneração extra equivalente a 07 salários mínimos em seus ‘holerits’.
Daí, você relembra alguns compromissos firmados pelo candidato Bolsonaro, como a privatização de empresas estatais, a eliminação de ministérios, conselhos e comissões e pesca, inclusive, uma específica, que era “acabar com os incentivos financeiros aos funcionários públicos por aplicação de multas… aquela lenga lenga de acabar com a “indústria de multas”, lembram-se?
É de se perguntar, então, como que uma população que, em sua imensa maioria, sobrevive às custas do Estado (comércio, transporte, imobiliárias, diversão, segurança, vigilância estão ao serviço do Estado ou de seus servidores), prefere eleger a direita, cuja essência política é a redução do Estado, em vez de votar na esquerda, cuja política fundamental é fortalecer o Estado e, consequentemente, o funcionalismo público?
Freud explica?