Quando eu era jovem, na década de 60, eu gostava de ler e pesquisar a história do Brasil. Aí veio a ditadura. Durante 21 anos, a história foi fantasiada, falsificada, reescrita, e isto me irritava profundamente. As frestas abertas em 1985 me ensinaram que não tinha sido apenas a ditadura que falsificara a história do país, mas a imensa maioria de nossos governantes. A elite brasileira leva a sério aquela frase feita sobre a história ser contada pelos vencedores. E ela é vencedora… A maior derrota que já engoliu, a eleição de Lula em 2002 e sua governança progressista por 12 anos, foi vomitada em 2014, quando Dilma, politicamente inepta, aceitou suas imposições e nomeou um sabujo da banca como ministro da Fazenda, para conduzir uma política econômica contrária à vontade expressa nos votos que a reelegeram.
Nos 12 anos de governo popular, com todos os erros cometidos pelo petismo, que não foram poucos, o povo participou, via parlamentares ou diretamente, via Conselhos, das decisões de Governo. Comissões e Conselhos populares foram criados para assessorar os atos emanados do Executivo e os projetos do Lagislativo… e mudaram a forma dos poderes se relacionarem com o povo.
Isto porque, mesmo respeitando a democracia formal de parlamentares que representavam o povo, criaram-se novos canais de participação da população, os quais passaram a influir também sobre os próprios parlamentares, quase equilibrando o poder legislativo, tornando-o menos refém de seus patrocinadores econômicos.
Depois das grandes guerras mundiais, do comunismo pagão, do capitalismo selvagem, do socialismo romântico, a elite percebeu que a democracia era o melhor regime de governo… desde que dominasse os representantes da população… E isto não era difícil: ganhar uma eleição exige dinheiro, muito dinheiro! Durante anos, multinacionais, indústrias, sindicatos, associações de classe bancaram os custos, e defensores de multinacionais, indústrias, sindicatos e associações de classe se tornaram vereadores, deputados e senadores e, também, prefeitos, governadores e presidentes.
Ou seja: quando é que o povo brasileiro como um todo, independentemente de profissão, classe social, nível de escolaridade, começou, realmente, a participar das decisões nacionais? Quando é que o povo brasileiro passou, realmente, a dar palpite em políticas públicas? Não foi quando começou a votar… nem quando, na euforia da derrubada da ditadura, as eleições gerais foram re-estabelecidas, mas quando os Conselhos e Comissões da sociedade civil foram criados e passaram a ter voz junto a Executivo e Legislativo na elaboração de leis e decretos direcionados ao povo brasileiro (alguém aí sabe ou lembra que a Lei da Ficha Limpa, o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social e a Lei de Combate à Compra de Votos nasceram de iniciativas populares?)
E não é que o Mito mandou acabar com todos estes Conselhos e Comissões? Ao que parece, na concepção dele, o povo atrapalha a governança do país… Na concepção dele, povo é gado… e gado precisa ser tangido com rédea curta e por quem tem mão forte. E uma democracia, por mais mambembe que seja, não permite isto.
Daí a quantidade de militares que ocupam cargos em seu governo e o poder que os pastores evangélicos têm sobre ele (aliás, a carreira militar e o pastoreio de almas estão muito em moda, atualmente, profissionalmente falando), daí a ideologização do Mais Médicos, que resultou na saída dos médicos cubanos, não substituídos em muitas áreas com precaríssima assistência à saúde, daí a ‘Lava Jato’ da Educação, daí os projetos de Ensino em casa e da Escola Sem Partido, daí as maldades da reforma da Previdência contra os menos favorecidos, daí a vontade de acabar com os ‘pardais’ eletrônicos nas rodovias, daí as ameaças de criminalizar as ações do MST e do MTST, daí tanta coisa mais contra conquistas populares dos últimos anos, que, em menos de 04 meses, o bolsonarismo vem tentando empurrar goela abaixo do país!
Seus fanáticos seguidores têm orgasmos diários pelas redes insociais. E, quando contestados com argumentos objetivos, que mostram o buraco em que o país continua enterrado, com 13 milhões de desempregados, com PIB murchando a cada trimestre, com uma desorganização institucional nunca vista, refutam que não há motivo nenhum de preocupação, vez que o filho nº 01 ou 02… eu nunca sei quem é quem…, afirmou peremptoriamente que o governo deles só pode dar certo, já que ele é guiado por Deus! Considerando que o povo brasileiro continua estupidamente crente, a afirmativa é válida: Jesus não só aparece em goiabeiras, como costuma ‘descer’ dos Céus no Palácio do Planalto indicando os caminhos a seguir (ou seria Edir Macedo e sua longa barba branca que ‘desce’ dos Estados Unidos e, por isso, precisou de passaporte diplomático para ele e sua digníssima cônje?).
Houve época no Brasil, há muito tempo atrás, que jovens de classe média, secundaristas e universitários, urbanos na maioria, se revoltaram contra o regime autoritário que nos governava, a falta de liberdade que imperava no país, a perseguição à lideranças políticas representativas, a brutalidade dos porões do regime. Nesta revolta, 434 pessoas foram mortas ou continuam desaparecidas, mas a ditadura foi derrotada. Infelizmente, os jovens de hoje se ocupam apenas de navegar na web ou em descobrir a darkweb ou se enturmar na deepweb. Quando abrirem os olhos para o país aqui de fora, não haverá mais país!