Com o impeachment, a velha política e seus poderosos mantenedores voltaram a mandar… e não quiseram moderar e compor com o petismo derrotado. Ao contrário! Numa conversa gravada ocultamente, o eterno líder de governo (de qualquer governo), senador Romero Jucá deu o tom do que seria o futuro governo: insistiu na necessidade de mudança (queda de Dilma), que colocaria o vice Temer no poder, estabelecendo-se um pacto nacional ‘com Supremo, com tudo’ para ‘estancar a sangria’ das investigações de corrupção de políticos e poderosos (nem todos, claro: peessedebistas e banqueiros continuam livres, leves e soltos, exceto o Eduardo Azeredo, que é o sujeito ideal para assumir a responsabilidade pelas sacanagens de toda a turma… (já era quando foi meu colega no Colégio Estadual!)
No fundo, a intenção era preparar o caminho, a ponte para o futuro, para que políticos do passado, do tradicional conservadorismo brasileiro, então representado por PSDB e PMDB e seus financiadores, reassumissem as rédeas do poder, voltando a fazer o que sempre fizeram em 500 anos de história política brasileira. Deu errado…
A direita radical, com apoio do alto e rico funcionalismo estatal, foi mais esperta: transformou Lula no “chefe da corrupção”, o petismo numa seita inepta e corrupta, comuno-chavista, inimiga de Deus e da família, como queriam todos os conservadores, mas adicionou ao caldeirão de ódio que precisava ser varrido da Pátria Mãe, os políticos cuja ideologia é, única e exclusivamente, defender os próprios interesses e dos grupos que os sustentam no poder, como, aliás, o próprio Romero Jucá.
O brasileiro médio, que adora apontar o dedo para corruptos, enquanto sonega Imposto de Renda ou molha a mão do policial que quer multa-lo por excesso de velocidade, o brasileiro pobre que ascendeu à classe média no período lulista, e estava correndo o risco de perder o novo status, e o povão, que odeia político safado, apesar de nunca se lembrar em quem votou, embarcaram na pregação de morros e dallagnois, globos e pastores neopentecostais.
Torpedeados por uma enxurrada de fake news disparadas por patrocinadores ‘ainda ocultos dos tribunais eleitorais’ e nos grandes motes da campanha bolsonarista: Brasil acima de tudo, Deus acima de todos, o Brasil não será uma nova Venezuela, armas para os cidadãos de bem, para o bem de nossas crianças, vamos implantar a Escola sem Partido e vamos acabar com a ideologia de gênero que está descontruindo a família brasileira, eles entraram numa espiral de ódio nas redes sociais que vai deixar cicatrizes abertas por muitos anos em muitas famílias.
E criaram o Mito!
Dia 1º de janeiro de 2019, como resultado disso, Jair Messias Bolsonaro assume a Presidência da República, levando com ele seus filhos e suas tropas, de choque e de generais, e suas hordas de valentões, que gostam de mostrar os bíceps, menosprezar mulheres e xingar homossexuais, que adoram gritar que bandido bom é bandido morto, que arrotam sua ignorância intelectual como se arte e cultura fossem idiotices criadas e realizadas por vagabundos que não conseguem fazer algo mais útil na vida.
Durante toda a minha vida, eu achei que o povo brasileiro estaria no poder no dia em que um deles, um petroleiro, um caminhoneiro, uma comerciária, uma professora, um operário fosse eleito para a Presidência. Lula, o metalúrgico, foi. Mas o verdadeiro povo brasileiro não alcançou o poder… ele ascendeu socialmente, é verdade, mas manteve seu caráter atávico, machista, racista, homofóbico, invejoso, passivo, cultural e politicamente analfabeto… Este povo está assumindo mesmo o poder só agora, com o capitão e sua gente!
Gente como o vereador paulista Fernando Silva Bispo (nome de guerra: Fernando Holliday), um dos fundadores do MBL. Quer coisa mais brasileira que este jovem criado pela mãe, auxiliar de limpeza, no bairro pobre Cohab 5, que estudou em escolas públicas e ganhou bolsa para seguir advocacia no IDP (do Gilmar Mendes) e que, mesmo sendo negro e homossexual assumido, é contra cotas para negros em universidades e quaisquer políticas públicas que combatam o racismo e a homofobia?
(continua amanhã)