Recomeçou um tempo de espera.
A presidenta Dilma concedeu uma entrevista aos blogs ‘sujos’,
na qual foi bastante incisiva: “Vou até as últimas conseqüências contra o golpe. Continuo sendo presidente.
Eu sou presidente da república.” Blogs ‘sujos’, representantes de movimentos sociais,
dirigentes de PT, PCdoB, PDT, figuras expressivas até de partidos que se aliaram pelo impeachment, Lula…
repercutem o enfrentamento determinado da presidenta.
Ela é guerreira, enfrentou a ditadura – e eu sei bem o quanto isto é difícil -, suportou a tortura do grande herói do deputado Bolsonaro.
E fraquejou uma única vez, quando, ao assumir seu segundo mandato, eleita por 54 milhões de votos, que acreditaram na manutenção de uma política de valorização do povo, se deixou convencer pelo mercado, pela mídia e por uma corja de políticos sem espinhas dorsais (alguns, dos próprios partidos que bancaram sua candidatura), que a solução da crise econômica internacional estava no mercado e na escolha de Joaquim Levy, do Bradesco, para o Ministério da Fazenda.
A resposta foi instantânea. Como queria o mercado, a oposição, os falsos companheiros que se agarram ao poder mais do que aos ideais, sua credibilidade foi p’ra’s cucuias. E o impeachment virou #hashtag da classe média!
A Câmara Federal, numa sessão inesquecível, atendeu os reclamos da opinião publicada e, em nome de Deus, dos filhinhos e de uma série de outras babaquices eleitoreiras, aprovou a admissibilidade do impeachment, encaminhando-o à apreciação do Senado. Agora, em vez de 513 representantes dos 204,5 milhões de habitantes dos 5.570 municípios brasileiros, teremos a honra de ouvir a voz de 81 probos cidadãos que, naquela augusta Casa, representam os 26 Estados da Federação e o Distrito Federal.
Recomeçou, pois, um tempo de espera.
De um lado, gente que está fora do poder federal há 14 anos, gente que participou deste governo durante os 08 anos de Lula ou dos 06 de Dilma, ou dos dois, gente que foi beneficiado com cargos, com isenções de impostos, com financiamentos camaradas, com subsídios, mas que não se satisfazem com isto ou que temem o crescimento social e a conscientização política do povão. Pelas câmaras, auto-falantes, páginas e sites das Organizações Globo e suas sub-concorrentes, alardeiam a legitimidade da ação política contra a presidenta, e operam, com sutileza cavalar, para dirigir a decisão dos nobres senadores.
Do outro lado, gente que apoiou publicamente a presidenta, mesmo quando ela optou por uma política econômica derrotada nas urnas, gente que virou as costas para ela e, só agora, sentiu que sem ela, as coisas vão ficar pior ainda, gente que tem consciência que a direita no poder representa repressão, arrocho salarial, privatização das nossas riquezas, gente que, como sempre, não consegue se unir nem no desespero: uns brigam para derrotar o impeachment, outros querem eleições diretas já!
Enquanto isto, o país para.
Eu acho que nós vivemos um golpe. Não acredito que o Senado vá mudar a tese consagrada pela Câmara Baixa que, em nome de Deus, da família e da propriedade, admitiu o impeachment. Suas Excelências da Câmara Alta talvez sejam mais discretas, menos ridículas e até consigam descobrir uma motivação constitucional – e não apenas política – que indique, de fato, que a presidenta Dilma cometeu crime de responsabilidade fiscal, devendo ser legalmente impedida de continuar governando. Mas, mesmo que não consigam imputar-lhe tal crime, não acredito que vão se importar com isto. Politicamente, ela já está derrotada, uma coisa que ficou bem clara quando o ministro Teori Zavascki, indicado por ela para o STF, pediu adiamento do julgamento da liminar que impede o ex-presidente Lula de assumir a Casa Civil do governo.
Mesmo que, num rasgo de consciência, o Senado não dê prosseguimento ao impeachment ou que, numa postura garantista, o STF, acionado pela AGU, julgue inadmissível o impeachment, sem que haja comprovação de responsabilização fiscal da presidenta, ela não terá mais condições políticas de governar.
Então, fico aqui pensando com meus botões, que não são tão reflexivos quanto os de Mino Carta, se não seria melhor para a presidenta e para as forças políticas que ainda a apóiam, jogarem a toalha…
A assunção de um político tradicional, mas sem voto, que foi companheiro de chapa por ser presidente do maior partido do país, mas que se tornou, em suas próprias palavras, um vice decorativo, a assunção do grupo de políticos que o cerca
– Moreira Franco, Eliseu Padilha, Romero Jucá, Henrique Eduardo Alves, Geddel Vieira Lima – figurinhas carimbadas que só conseguem sobreviver politicamente se estiverem agarrados às tetas do Estado, sem falar no “impoluto” deputado que ainda preside a Câmara, a implementação do plano “Ponte para o Futuro”, um conjunto de proposições neo-liberais que, certamente, aprofundará a situação recessiva do país e a cobrança inevitável que o poder econômico fará, por ter apoiado, política e financeiramente, o processo de impeachment, terá conseqüências, muito graves por um lado, e muito auspiciosas por outro.
Graves, gravíssimas mesmo, porque o país regredirá mais uma vez, como aconteceu em 1954 e em 1964, em todos os sentidos: politicamente, economicamente, internacionalmente, socialmente…
Auspiciosas porque, depois que descobriu-se como personagem com voz e opinião – expressada para um lado ou para o outro através das redes sociais – a população irá, naturalmente, cobrar seus direitos, e não se sujeitará, mais dia, menos dia, às imposições, legais ou não, determinadas por um governo não eleito democraticamente.
Não seria melhor para as forças progressistas do país que esta conscientização política do povo se configurasse mais rápido? Um governo Temer, pela sua tibieza, inexpressão e caráter dúbio, seria adequado para isto.