O que acontecerá ao Brasil nos próximos meses, quem tem mais de 60 anos como eu e viveu este período da história, pode dizer sem medo de errar: haverá uma recuperação econômica fantasiada de ‘boom’ pela grande imprensa, haverá uma falsa redução do desemprego – terceirizados que ocupam os lugares de demitidos ou demitidos que são recontratados como terceirizados – haverá uma sombra geral sobre a realidade brasileira, já que há, como anuncia com estardalhaço a Rede Globo, um hexacampeonato a ser ganho pelo Brasil na Rússia (apagando a humilhação dos 7×1, da Dilma!), e uma eleição sem Lula, a ser vencida por Hulk ou Maia ou Alkmim ou qualquer outro sucedâneo collorido, brasileiros “do bem”, já que bem nascidos e viventes em acordo com as normas da “sociedade esclarecida” que sempre empalmou o poder e sempre “bem governou” o país…
Pelo que dizem seus aliados, pelo que demonstra o PT, pelo que se conhece do homem Luiz Inácio Lula da Silva, a luta continua: sua candidatura está mantida e será levada até onde for possível. Não conheço Lula pessoalmente, não conheço seus amigos, não tenho qualquer relação com seus gurus políticos ou companheiros dos tempos sindicais e presidenciais… Mas, se eu fosse ele, eu pediria para os advogados não entrarem com qualquer recurso legal em relação à condenação a 12 anos e 01 mês de prisão. Se eu fosse ele, eu me entregaria ao juiz Moro o mais rápido possível, para cumprir a sentença aumentada pelo TRF-4…
Se eu fosse Lula, antes de me entregar ao justiçamento indecoroso, eu chamaria os partidos de oposição, os progressistas e democratas sérios deste país – PT, PDT, PSOL, PCdoB, os movimentos sociais como MST, MTST, intelectuais, artistas e quem mais houvesse, construiria um consenso com candidato único para 2018, apoiado pela “marca Lula”, indicando candidatos fortes desta coligação para disputar a Câmara e o Senado, e daria uma entrevista aos blogs sujos, aberta à imprensa em geral, na porta do Fórum de Curitiba, conclamando o povo a votar nestes candidatos, entregando-se, logo depois, à prisão.
Não entendo de jurisprudência, mas acho que a lei, em qualquer hipótese, estabelece que há uma progressão de pena. Bom comportamento, estudo, leitura, indicam cumprimento de 1/6 da pena ou, no caso de Lula, 02 anos e 05 dias… Mandela ficou 27 anos preso, foi solto no bojo de uma revolta popular e se tornou o primeiro presidente negro de uma nação racista. Um líder sindical chamado Luiz Inácio da Silva, ficou preso por 31 dias durante a ditadura e virou presidente do Brasil por dois mandatos, dos quais saiu com 80% de aprovação popular. Preso novamente, Lula não disputaria em 2018, mas ganharia fácil, muito fácil, em 2022. Por que não?
Ou seja, a hora é de juntar forças que, historicamente, não costumam se unir por vírgulas, picuinhas e vaidades pessoais, formar boas bancadas no Congresso Nacional e nas Câmaras Estaduais, bem como criar uma poderosa rede de apoiadores na Internet, permanentemente conectada às redes sociais, não só para combater as medidas cada vez mais regressivas e ante populares que o governo eleito em 2018 terá que tomar inevitavelmente, pois sua sustentação estará baseada exclusivamente no grande capital internacional e na elite brasileira, como para comparar a vida que o povo teve a partir do golpe de 2016 e a vida dos tempos lulistas.
É óbvio que uma luta política não se resolve de forma tão simplista como esta. Há extensas costuras a serem feitas, há enormes egos a serem compelidos a renúncias pessoas e há um sem número de riscos a serem pesados, o maior deles a própria prisão de Lula. Que pode resultar em duas coisas: uma revolta geral do povão, que periga ser extremamente explosiva se não houver lideranças para conduzi-la de forma a não haver derramamento de sangue inocente, ou uma passividade total do povão, que levará os donos do poder, certamente, a prosseguir na sanha persecutória a Lula, condenando-o, praticamente, à prisão perpétua através dos outros processos que ele continua respondendo na Justiça, além de intensificar a perseguição implacável a seus filhos, parentes e companheiros.
Esta é a encruzilhada de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele não tem mais sua Marisa Letícia para o aconselhar. E terá que perscrutar sua própria consciência. Ele já é um mito político do mundo inteiro, um nome gravado definitivamente na história brasileira e uma figura que será lembrada, com respeito, nas histórias de muitos países sul americanos e africanos. Valerá a pena correr o risco de morrer na prisão para, mais uma vez, conduzir este povão sofrido e pouco politizado para virar o jogo definitivamente?
Alguns anos atrás, na casa de um parente, eu conversei com um senador petista muito próximo de Lula. Boas bebidas à vontade, poucos interlocutores, a conversa rolou solta e foi longe. Muito provavelmente, pela minha natural curiosidade jornalística, apesar de já aposentado, eu comecei a especular sobre o homem Luiz Inácio da Silva e não o já então mito Lula. Aquela curiosidade de querer saber se o cara bebia pinga pra valer, se ficava coçando o saco enquanto falava palavrão “pra c……*, se era mesmo simples ou a imagem era fabricada, e se, mesmo sem ser formado, tinha uma visão própria do mundo, não repassada pelo Zé Dirceu ou Marco Aurélio Garcia ou outro guru qualquer…
Senador é senador e, p…* velha da política, ele escapava de todas as cascas de banana que eu ia colocando na conversa, até que, em determinado momento, ele deixou entrever, com um laivo de mágoa, que Lula não tinha companheiros pessoais… tinha parceiros de uma luta pessoal, que podiam ser – e eram – descartados, caso não transformassem esta luta numa questão pessoal, mais importante que qualquer outra coisa na vida. E esta luta sempre foi a redenção do povo brasileiro. Por isto, para ele, Lula, valia a pena entregar anéis aos Sarneys, aos Costa Netos, aos Roberto Jeffersons, aos Temers, ao diabo, se fosse o caso, garantindo uma governabilidade que permitiria ao povão subir mais degraus na vida.
Será que tantos anos depois e com a perseguição implacável movida pela elite econômica e política a ele, a dona Marisa e a seus filhos, Lula continua lutando sua luta pessoal? Retomo e refaço Drummond:
“Está sem mulher,/está sem discurso,/está sem carinho,/já não pode beber,/já não pode fumar,/cuspir já não pode,/a noite esfriou,/o dia não veio,/o bonde não veio,/o riso não veio,/não veio a utopia/e tudo acabou/e tudo fugiu/e tudo mofou, e agora, Luiz Inácio?”
…
“Sozinho no escuro/qual bicho-do-mato,/sem teogonia,/sem parede nua/para se encostar,/sem cavalo preto/que fuja a galope,/você marcha, Luiz Inácio! Luiz Inácio, para onde?”