Repressão e hipocrisia (I)

Conforme li outro dia num blog, a nova onda de repressão às artes, incluindo mostras em museus, é uma derivação do ódio ao petismo: as mesmas pessoas que se beneficiaram da onda anti-petista, para parecerem heróis e se tornarem figuras internético/midiáticas, seguidas por milhares de pessoas nas redes sociais (e conseguiram), já perceberam que este antagonismo, após o desastre que é o governo Temer,  perdeu força e, daí, tentam arrumar outros “Judas” para serem diariamente malhados, o que lhes garante a manutenção da fama por mais algum tempo.

Pode ser que isto seja um fator deste repentino furor de grupos que se notabilizaram, através das redes sociais, por mobilizar jovens a vestir verde-amarelo e sair às ruas para pedir o impeachment da ex-presidenta, mas eu acho que não é o fator preponderante. Há muitos outros ingredientes que, ao longo destes últimos anos, foram sendo adicionados a esta face pouco visível do brasileiro em geral, mas que sempre existiu por trás do sujeito solidário, alegre, brincalhão, cheio de paz e amor para dar.

Aliás, há uma discussão filosófica sobre o que seria realmente o brasileiro cordial apresentado pelo Sérgio Buarque de Holanda, o pai do Chico, em seu livro Raízes do Brasil: em linhas gerais, a cordialidade pátria, representada por virtudes como hospitalidade e generosidade é “um traço do caráter brasileiro…” Mas tais virtudes não significam “bondade ou amizade”… São, sim, um disfarce para preservar o verdadeiro eu de cada um. Ou, em tradução livre, como querem alguns: ser cordial é ser governado pelo coração, pela emoção, com capacidade infinita tanto de amar quanto de odiar. E ódio é algo que, se bem plantado e cultivado, dá frutos por muito tempo!

Fato é que uma parte dos brasileiros, hoje, odeia. De forma irracional ou, melhor, de forma cordial!

E não há como inocentar os governos petistas de parte da culpa desta nova face mostrada pelo brasileiro: ao propor e sustentar políticas que permitiram que 36 milhões de brasileiros ascendessem um ou dois degraus na escala social, da pobreza à classe média baixa, baseados apenas nos aspectos econômicos, via salário mínimo acima da inflação, bolsa família, FIES, PROUNI, Minha Casa Minha Vida – não cuidaram da alfabetização política, que ficou para uma segunda etapa, iludidos pela certeza que não haveria reação da elite e que ficariam no poder por, pelo menos, 20 anos…

Não ficaram e se fubecaram, cuspidos fora inclusive pelos 36 milhões, que gostaram da ascensão e queriam mais, mas não estavam recebendo!

A nova classe média baixa gostou de botar filho na Universidade… gostou de viajar de avião para rever a família que não via há 20 anos… gostou de comprar TV de plasma… gostou de comprar carro e mandar o buzu a p…* que pariu e gostou muito de achar que tinha voz e voto, que elegia quem quisesse…!

Se ferrou, claro! Virou desempregada, terceirizada ou “micro empreendedora” (nome chique que o capitalismo dá para quem vende DVD paraguaio na esquina ou faz churrasquinho de gato em frente a uma igreja pentecostal do 29º dia), trocou a TV de 32” por uma usada de 18”, com antena digital, vendeu o carro e voltou a andar de metrô e buzu – e está doida para que o vizinho da casa à esquerda, que mantém o emprego numa loja que ainda não faliu, se f…*

Há outros culpados, é óbvio! E em maior grau com certeza. A elite que come filé há 500 anos e não consegue dividir o osso… Quem acompanhou a última novela das seis da Globo (os irmãos sem nome são a própria elite, óbvio, mas, como tal, são espertos, sabem jogar em todas as posições), sobre os anos pré-independência do Brasil (Novo Mundo), teve uma visão bem objetiva desta elite, representada pelo personagem Sebastião, o mercador de escravos, que é pai de uma das sub-mocinhas, apaixonada por um negro liberto (como eu disse, a Globo é esperta, sabe contrapor o mal ao bem, inapelavelmente vencido pelo último nos últimos capítulos… Plim plim!)

Foi esta elite que, manipulando bolsos, corações e mentes, suicidou Getúlio em 1954, baniu Jango em 1964 e inviabilizou Dilma em 2014, com direito à impeachment dois anos depois… e está impondo esta agenda absurda e regressiva que vai levando o Brasil de volta ao 1º Império, quando os trabalhadores eram escravos e os senhores eram os criadores e executores das leis, sempre em benefício próprio.

A classe média também entra com sua parcela de culpa: acostumada, desde a industrialização, iniciada por Getúlio, a beliscar uma parcela do poder ou, pior, ser indicada pela elite para representa-la no poder (obedecendo suas ordens, claro!), não gostou de ver mais gente ascendendo na escala social e disputando as ruas, os céus, os bancos universitários e as lojas do shopping…

Odiou a concorrência, empunhou seus celulares e, devidamente incentivada, saiu às varandas dos apartamentos e às avenidas das grandes cidades batendo panelas e vestindo verde-amarelo! (continua) 

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